Textos Reflexivos

Psicologia e Esporte

Fonte da Imagem: https://www.galvilasports.com.br/mini-taca-copa-do-mundo.html

Por: Debora Berger Schmidt

Em tempos de copa de mundo convém uma reflexão sobre algumas questões que envolvem os esportes. Em meio a manifestações emocionadas de jogares, discursos otimistas de treinadores e críticas ácidas de comentaristas – que no fundo todos somos – não raramente vemos times e atletas despencarem de fases gloriosas por motivos “puramente” psicológicos. Quem não se lembra da repercussão sobre a Psicologia do Esporte na copa do mundo de 2014?

Justamente nesses momentos que geralmente nos lembramos da Psicologia: quando a crise se instala. Em outras palavras, o pódio tende a ser associado como resultado do exaustivo trabalho de um corpo (força, resistência, agilidade, flexibilidade, entre outros). E a derrota, por sua vez, parece que está mais relacionada a um fracasso emocional.  A verdade é que a Psicologia possui espaço conquistado dentro do esporte considerando os aspectos psicológicos como um dos fatores que compõem a vitória. Segundo Cozza (2008) a Psicologia do Esporte oferece um estudo científico dos fatores psicológicos que estão associados à participação de performance nos esportes, auxiliando atletas e pessoas a utilizar princípios psicológicos para melhorar desempenho e promover bem-estar. Dentro da Neuropsicologia as práticas esportivas tem se configurado como área de aplicação em duas vertentes (Lages et al., 2010):

  1. 1. Consequências das lesões cerebrais adquiridas nas práticas esportivas. A concussão se refere a um trauma resultante de forças sobre a cabeça, que pode acontecer com ou sem impacto, induzindo à alteração do estado mental por mudanças estruturais ou funcionais do cérebro (Lages et al., 2010).
  2. 2. Compreensão de aspectos psicológicos relacionados ao desempenho de atletas a partir de demandas cognitivas específicas para cada esporte. Essa perspectiva compreende que além das habilidades motoras em si, outras habilidades cognitivas são importantes para a execução adequada do ato motor. Características de personalidade, variáveis cognitivas e emocionais compõem um espectro de situações que envolvem o desempenho esportivo. Dentre as variáveis psicológicas o constructo impulsividade ganha destaque nas praticas esportivas. Ela se refere a produção de respostas rápidas sem uma reflexão adequada, ou a baixo foco atencional e também se relaciona a motivação do atleta (Lages et al., 2010).

Estudos das Neurociências voltadas para o contexto do esporte não é novidade. Um estudo japonês analisou a atividade cerebral de Neymar e outros atletas e chegou a considerações interessantes. Segundo Naito e Hirose (2014), ao fazer movimentos com os pés, Neymar demanda baixa atividade cerebral para execução da atividade. Isso é característico de pessoas com habilidades consolidadas, como por exemplo, um pianista experiente ao manipular seus dedos. O contato desde cedo do jogador com bolas de diferentes tamanhos e materiais poderiam ter moldado o uso característico de seu cérebro ao controlar seu pé. Mas o que chama atenção é que o jogador quase não apresentou diferença de processamento cerebral movimentando ou não o pé. Ou seja, Neymar precisa de menos esforço para fazer os movimentos dos pés, permitindo que o cérebro do jogador fique disponível para leitura do jogo, planejamento de jogadas, movimentação ágil e compreensão dos adversários, requisitos fundamentais para execução da tarefa principal do artilheiro: fazer o gol.

O estudo acima é um exemplo de uma das práticas da Psicologia dentro do contexto do esporte. Atenção concentrada, capacidade de lidar com estímulos, inclusive internos (como ansiedade), são consctructos psicológicos que podem – e devem – ser abordados por atletas de alto rendimento. No Brasil, em estudo publicado por Vilarino et al (2017) com objetivo de analisar a evolução de grupos de pesquisas dentro da Psicologia do Esporte, concluiu-se que os temas mais investigados estão relacionados a ansiedade e motivação. Essas variáveis têm sido estudadas o intuito de verificar como tais fatores interferem no desempenho de atletas e também como o exercício físico pode auxiliar no tratamento de tais doenças. Já as modalidades esportivas mais estudadas e publicadas foram futebol, voleibol e basquete, refletindo a popularidade de tais práticas no Brasil.

As contribuições da interlocução da Psicologia com o Esporte parecem estar claras, mas estão longe de serem populares no Brasil. Em Abril de 2018, a página do Esporte Interativo publicou que dos 20 times da série A do Brasileirão, somente 4 possuem psicólogo na composição da sua equipe! Ou seja, a Psicologia ainda tem alguns desafios a conquistar…

 

 

Referencias

Cozza, H. F. P. (2008) Avaliação Neuropsicológica das Funções Executivas de Atletas e Correlação com o Desempenho em Situação de Jogo, Tese de Doutorado, Universidade São Francisco, Itatibaia – SP.

Lages, G. M., Ugrinowistsch, H., Malloy-Diniz, L. (2010) Práticas Esportivas. In:  Malloy-Diniz, l. Fuentes, D., Mattos, P., Abreu, N., Avaliação Neuropsicológica. Porto Alegre: Artmed.

Naito, E. & Hirose, S. (2014) Efficient foot motor control by Neymar’s brain. Front Hum Neurosci. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4118031/

Vilarino, G. T., Dominsk, F. H., Andrade, R. D., Felden, É. P. G., & Andrade, A.. (2017). Análise dos grupos de pesquisa em psicologia do esporte e do exercício no Brasil. Revista Brasileira de Ciências do Esporte39(4), 371-379. https://dx.doi.org/10.1016/j.rbce.2017.07.004

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