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Por Psic. Débora Berger Schimidt
O que as pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranquila. Em silêncio. Sem dar conselhos. Sem que digam: “Se eu fosse você…” A gente ama não é a pessoa que fala bonito. É a pessoa que escuta bonito. A fala só é bonita quando ela nasce de uma longa e silenciosa escuta. É na escuta que o amor começa. E é na não escuta que ele termina.
Rubem Alves, autor da frase acima, é mineiro, nascido no ano de 1933, ao longo de sua vida conquistou títulos: pianista, teólogo, psicanalista, pós-graduado, doutor, pai, educador, esposo, cronista, avô, filósofo, professor, escritor, foi premiado inúmeras vezes, e, como descrito em sua página “encantou-se em 19 de julho de 2014”. Antes disso, enfrentou um câncer de estômago e o Mal de Parkinson.
Tão intensa quanto a sua biografia são as incontáveis possibilidades de reflexão que sua obra permite fazer. A frase em questões faz parte do livro do autor “O amor que acende a lua”, publicado em 1999, e fala sobre a importância do silêncio. Mas não de um silêncio qualquer, e sim do silencio acolhedor.
Esse é o absurdo segredo da escuta: é preciso não escutar o que se diz para se poder ouvir o que ficou não dito, a música. É na música que mora a verdade daquele que fala.
(…)
Assim, se você quiser ouvir bem, não preste muita atenção na letra. Esqueça as lições da hermenêutica, a ciência da interpretação dos sentidos. Aprenda a sentir a música. Todos os tipos de música, do tam-tam dos tambores a Boulez. Porque o que os compositores fizeram foi só fazer tocar em instrumentos aquilo que era tocado pelo corpo. Parafraseando Uexküll: “Todo corpo é uma melodia que se toca.” Seria bom se, nos cursos de psicologia, se lesse menos livros e se ouvisse mais música.
Como psicóloga é impossível não se sentir convocada com trecho acima da mesma crônica supracitada. A partir de diferentes técnicas os cursos de Psicologia ensinam a ouvir. Mas ouvir para além do que é dito é preciso muito mais do que técnica, e definitivamente não se restringe a psicólogos. É preciso conexão e empatia capaz de ouvir o silêncio: aquilo que não é dito, mas é sentido. Em outra crônica intitulada como “Escutatória”, do mesmo livro, Rubem Alves escreve:
Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir. Pensei em oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém vai se matricular.
Parafraseio o Alberto Caeiro: “Não é bastante ter ouvidos para ouvir o que é dito; é preciso também que haja silêncio dentro da alma”. Daí a dificuldade: a gente não aguenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor, sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer. Como se aquilo que ele diz não fosse digno de
descansada consideração e precisasse ser complementado por aquilo que a gente tem a dizer, que é muito melhor. Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil de nossa arrogância e vaidade: no fundo, somos os mais bonitos.
Fonte da imagem: https://www.pensador.com/autor/rubem_alves/ |
Nos tempos em que todos possuem acesso a todo tipo de informação, e, por conseguinte, opinião construída para tudo, o silêncio é cada vez mais raro.
Não basta o silêncio de fora. É preciso silêncio dentro. Ausência de pensamentos. E aí, quando se faz o silêncio dentro, a gente começa a ouvir coisas que não ouvia.
(…)
Que bom seria se todo ser humano fosse capaz de ouvir os seus silêncios de dentro para sentir e valorizar o que não é mensurável e as reais necessidades de cada um…
Caso você tenha se sentido instigado a ler mais sobre o autor, nesse link você encontrará mais da biografia e obra de Rubem Alves.
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