Por: Débora Berger Schmidt
Não tenho medo da morte mas sim medo de morrer
qual seria a diferença você há de perguntar
é que a morte já é depois que eu deixar de respirar
morrer ainda é aqui na vida, no sol, no ar
ainda pode haver dor ou vontade de mijar
A morte já é depois já não haverá ninguém
como eu aqui agora pensando sobre o além
já não haverá o além o além já será então
não terei pé nem cabeça nem figado, nem pulmão
como poderei ter medo se não terei coração?
Não tenho medo da morte mas medo de morrer, sim
a morte é depois de mim mas quem vai morrer sou eu
o derradeiro ato meu e eu terei de estar presente
assim como um presidente dando posse ao sucessor
terei que morrer vivendo sabendo que já me vou
Então nesse instante sim sofrerei quem sabe um choque
um piripaque, ou um baque um calafrio ou um toque
coisas naturais da vida como comer, caminhar
morrer de morte matada morrer de morte morrida
quem sabe eu sinta saudade como em qualquer despedida
Com uma voz tão doce para tratar de um assunto tabu na nossa cultura ocidental, a canção de Gilberto Gil “Não tenho medo da morte” foi gravada recentemente em virtude de sua luta contra a insuficiência renal. O artista traça um paralelo muito bonito entre “morrer” e “deixar de viver” (morrer em vida).
Morrer em vida é uma saída mais comum do que se pode imaginar em pessoas com doença crônica, inclusive a doença renal. Não raramente escutamos nesse contexto depoimentos vivos de quem escolheu já não mais viver, e, assim seguem os dias com passividade na eterna espera da confirmação da finitude.
Longe de fazer essa escolha, Gil segue tocando literalmente a sua vida (e as nossas também) traduzindo sentimentos em belíssimas canções, e ainda tem muito a nos ensinar sobre a naturalidade da vida e sua finitude.
Se Fernando Sabino fala que é preciso “Fazer da queda um passo de dança (…)”. Gil faz das suas vivências com a doença embalos para muitas reflexões:
“Ela mandou arrancar quatro pedacinhos do meu coração
Depois mandou examinar os quatro pedacinhos
Um para saber se eu sinto medo
Um para saber se eu sinto dor
Um para saber os meus segredos
Um para saber se eu sinto amor.”
Quatro Pedacinhos – Gilberto Gil
(Música que compôs para sua médica depois de uma cirurgia no coração)
Recentemente no programa “Conversa com Bial”, ele explicou sobre como construiu sua percepção sobre a morte, e suas reflexões sobre doenças, tratamento e sua própria finitude.
Vale a pena assistir!
Fabiana
Muito legal!!