Por: Debora Berger Schmidt
Noite e dia. Silêncio e música. Repouso e movimento. Riso e choro. Calor e frio. Sol e chuva. Abraço e separação. Chegada e partida: São os opostos que dão valor à vida.
Vida e morte não são inimigas, são irmãs.
Rodolfo Lopes
Freud, em determinado momento de sua obra, conta a experiência de uma conversa com um poeta amigo sobre a beleza da natureza em um dia de verão. Incomodado com a transitoriedade das coisas, o poeta questiona de que adiantaria tanta beleza se ela estava fadada a desaparecer no inverno.
Contrário ao olhar pessimista do amigo, Freud não entendia porque a natureza, uma obra de arte, ou mesmo uma realização intelectual, teria seu valor diminuído por estar limitado a um espaço de tempo, e conclui: “o valor da transitoriedade é o valor da escassez no tempo”. Em outras palavras: para Freud, o que confere beleza as coisas não é sua duração absoluta, ou sua proximidade a eternidade, mas sim a significação que essas mesmas coisas adquirem para uma pessoa em um determinado momento de sua vida.
O trabalho com transplante nos remete diretamente sobre a brevidade da vida e sobre a transitoriedade das coisas: Uma vida não deixa de ser bonita pelo seu fim, ainda mais quando se transforma em tantas outras.
Enfrentar uma doença crônica, cujo tratamento que mais se assemelha a vida sem doença é um transplante, é sem dúvida um grande desafio. Muitas vezes a decisão de transplante não envolve somente um receptor, mas sobretudo um doador, que se dispõe em literalmente partilhar da sua vida, que passa a não estar mais limitada a um espaço de tempo.
Doar, entretanto, deve ser uma decisão consciente, movida por empatia e desejo. Quando as relações entre doador e receptor estão permeadas por obrigações, dívidas, angústias e ressentimentos, o que se consolida não é a vida, e sim o sofrimento.
Diante disso a Psicologia faz avaliações que antecedem o transplante com objetivo de compreender as motivações, expectativas e relações permeadas entre o doador e receptor, favorecendo para o sucesso de transplante. Nesse caso, vale ressaltar que o sucesso não se restringe ao procedimento cirúrgico, mas na continuidade de uma vida plena, com relações saudáveis e bem estar emocional.
“Sobre a Transitoriedade”, de S. Freud, 1916/1915, vol XIV das Obras Completas – Imago
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